Jogos urbanos
Alexandre lemosReviramos as lixeiras dos artistas de tevê
Adoramos as vitrines, os letreiros em néon
Assistimos os comícios e os fogos do reveillon
Nós estamos mal vestidos, mais um dia que se vai
O banquete dos mendigos em noite de black-tie
Nós estamos mal nutridos, as migalhas pelo chão
Nossos próprios inimigos nos carregam pela mão
Construímos as igrejas porque somos bons cristãos
E matamos nossos sonhos com as nossas próprias mãos
Procuramos o messias nas manchetes do jornal
Nossas velhas fantasias esperando o carnaval
Nós estamos enrugados, trabalhamos sol a sol
A nau dos desesperados procurando algum farol
Nós estamos condenados, quem consegue ser feliz
Entre a mira dos soldados e o martelo do juiz
Nós estamos por aí, quase nada pra fazer
Nós estamos por aí, excrementos do poder
A milícia faz a ronda, vão também os marginais
Lado a lado, na penumbra, todos eles são iguais
Os pivetes tomam conta das mulheres de aluguel
Cai a chuva na cidade, o castigo vem do céu
Confessamos o pecado, imploramos o perdão
Acendemos nossas velas para o santo de plantão
A insônia em nossas camas, velho filme de terror
Esfregamos nossos corpos, dez minutos de amor
Os pastores eletrônicos explorando a nossa fé
Nós estamos de joelhos e o pastor está de pé
Apontando os nossos erros e contando os seus milhões
Loteando o paraíso em suaves prestações
Nós vendemos nosso sangue, nós gostamos de cantar
'inda nem estamos bêbados e o bar já vai fechar
Nós fazemos edifícios e moramos na prisão
Respeitamos o chicote e jamais dizemos não
Nós estamos por aí, não queremos nem saber
Nós estamos por aí, excrementos do poder
Nas escolas nos ensinam como nós devemos ser
Rabiscamos os banheiros e aprendemos o dever
Nossa droga misturada, nosso prato de feijão
Nossos dentes amarelos de açúcar e aflição
Nossos ídolos de barro, nossos deuses de marfim
A fumaça do cigarro passeando no jardim
Nossos planos pro futuro, onde é que vão parar?
Temos medo do escuro e a luz pode nos cegar
Nós estamos por aí, nós queremos é viver
Nós estamos por aí, excrementos do poder