Rui veloso

Terra de ninguém

Rui veloso
Olha o cigano
Chegou à vila
Com o chapéu preto e o mundo na mochila

Abriu o saco
Montou a banca
Subiu o pano e fez uma feira franca

Viva o cigano
Viva o cesteiro
Que vende o mundo por pouco dinheiro

Ai, venham todos a correr para vê-lo
Junto à igreja matriz
A equilibrar uma escova de cabelo
Mesmo na ponta do nariz

Olha o cigano
Entre as mulheres
A vender meias, colchas e talheres

Vende perfumes
Terços e pentes
Anéis e sedas e pasta dos dentes

Vende santinhos
Pedras de jade
E as pomadas da eterna mocidade

E sabe dançar a dança da chuva
E deitar as cartas à gente
Engolir fogo e caminhar sobre o vidro
E encantar uma serpente

No fim do dia
Quando ia embora
Eu quis saber onde é que o cigano mora

Mostrou-me um mapa
De cor sumida
Onde corriam os rios da vida

Eu moro aqui
Eu moro além
Moro no mundo na terra de ninguém

Viva o cigano dos quatro caminhos
A tocar flauta de pan
Entre tesouras, guarda-chuvas e navalhas
O seu destino Deus dará

VIVA O CIGANO, CIDADÃO DO MUNDO!

Viva o cigano
Um aldeeiro
Que vende o mundo por pouco dinheiro

Viva o fulano
No seu vaivém
Que tem vivenda na terra de ninguém

Viva o cigano
Viva o paisano
Que já é noite e vai cair o pano

E fez comigo um negócio da China
Vendeu-me a terra de ninguém
E pelo preço irrisório de um sorriso
Vendeu-me as estrelas também

Viva o cigano!
Viva o paisano!
Viva o sicrano!
Viva o fulano!
Viva o cigano!
Viva o cigano!
Viva o paisano!
Viva o sicrano!
Viva o fulano!

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