Anoitecer
José miguel wisnik
É a hora em que o sino toca,
mas aqui não há sinos
há somente buzinas,
sirenes roucas, apitos
aflitos, pungentes, trágicos,
uivando escuro segredo
desta hora tenho medo.
mas aqui não há sinos
há somente buzinas,
sirenes roucas, apitos
aflitos, pungentes, trágicos,
uivando escuro segredo
desta hora tenho medo.
É a hora em que o pássaro volta,
mas de há muito não há pássaros
só multidões compactas
escorrendo exaustas
como espesso óleo
que impregna o lajedo
desta hora tenho medo.
É a hora do descanso,
mas o descanso vem tarde,
o corpo não pede sono,
depois de tanto rodar
pede paz - morte - mergulho
no poço mais ermo e quedo
desta hora tenho medo.
Hora de delicadeza,
gasalho, sombra, silêncio.
Haverá disso no mundo?
É antes a hora dos corvos,
bicando em mim, meu passado,
meu futuro, meu degredo
desta hora, sim, tenho medo.
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