Lupão

O vôo do carcará

Lupão
Eu vi caldeiras em chamas flamejantes
Derretendo sentimentos descartáveis
Metralhadoras nas mãos dos miseráveis
Eu vi milhões de navalhas sobre o chão
Um rio de sangue expelido de um vulcão
Capitalistas no sangue se afogando
Então eu vi o carcará passar voando
Sereno e frio sobre todos a planar

Vi cachoeiras vomitando óleo diesel
Eu vi o impermeável se afogar
Uma panela de dinheiro a cozinhar
Rodeada de crianças desnutridas
Eu vi a mãe pelos filhos extorquida
Eu vi um mar fervente borbulhando
Então eu vi o carcará passar voando
Sereno e frio sobre todos a planar

Voa, voa, voa, voa, voa
Voa carcará

Eu vi a última flor ser mastigada
Por um porco que andava em duas patas
Enquanto bebia uísque e dava cartas
Tal qual eu li na obra do inglês
Vi mil coriscos rasgando o céu de uma vez
Eu ouvi as engrenagens estalando
Então eu vi o carcará passar voando
Sereno e frio sobre todos a planar

Eu vi um Deus gritar em cada esquina
Eu vi a culpa perder o seu valor
Então senti que passava o meu temor
Senti que não haveria diferença
Que era apenas mais uma transcendência
Eu ouvi a natureza se acalmando
Então eu vi o carcará devorando
O último homem ainda a agonizar

Voa, voa, voa, voa, voa
Voa carcará

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