Capítulo 4, versículo 3
Racionais mc'sA cada 4 pessoas mortas pela polícia, 3 são negras
Nas universidades brasileiras apenas 2% dos alunos são negros
A cada 4 horas, um jovem negro morre violentamente em São Paulo
Aqui quem fala é Primo Preto, mais um sobrevivente
Minha intenção é ruim
Esvazia o lugar
Eu tô em cima, eu tô afim
Um, dois pra atirar
Eu sou bem pior do que você tá vendo
O preto aqui não tem dó
É 100% veneno
A primeira faz bum, a segunda faz tá
Eu tenho uma missão e não vou parar
Meu estilo é pesado e faz tremer o chão
Minha palavra vale um tiro e eu tenho muita munição
Na queda ou na ascensão, minha atitude vai além
E tenho disposição pro mal e pro bem
Talvez eu seja um sádico
Ou um anjo
Um mágico
O juiz ou o réu
Um bandido do céu
Malandro ou otário
Padre sanguinário
Franco atirador se for necessário
Revolucionário
Insano
Ou marginal
Antigo e moderno
Imortal
Fronteira do céu com o inferno
Astral imprevisível
Como um ataque cardíaco
No verso
Violentamente pacífico
Verídico
Vim pra sabotar seu raciocínio
Vim pra abalar o seu sistema nervoso e sanguíneo
Pra mim ainda é pouco
Brown cachorro louco
Número 1 dia
Terrorista da periferia
Uni-duni-tê
O que eu tenho pra você
Um rap venenoso ou uma rajada de PT
E a profecia se fez como previsto
1 9 9 7 depois de Cristo
A fúria negra ressuscita outra vez
Racionais capítulo 4 - versículo 3
Aleluia, aleluia
Racionais no ar, filha da puta, pá, pá, pá
Faz frio em São Paulo
Pra mim tá sempre bom
Eu tô na rua de bombeta e moletom
Dim dim dom
Rap é o som
Que emana do Opala marrom
E aí
Chama o Guilherme
Chama o Vander
Chama o Dinho
E o Gui
Marquinho chama o Éder, vamo aí
Se os outros manos vem, pela ordem tudo bem
Melhor
Quem é quem no bilhar no dominó
Colô dois manos
Um acenou pra mim
De jaco de cetim
De tênis, calça jeans
Ei Brown, sai fora
Nem vai, nem cola
Não vale a pena dar ideia nesses tipo aí
Ontem à noite eu vi na beira do asfalto
Tragando a morte, soprando a vida pro alto
Ó os cara só o pó, pele o osso
No fundo do poço, traz flagrante no bolso
Veja bem, ninguém é mais que ninguém
Veja bem, veja bem, eles são nosso irmãos também
Mas de cocaína e crack
Whisky e conhaque
Os manos morrem rapidinho sem lugar de destaque
Mas quem sou eu pra falar
De quem cheira ou quem fuma
Nem dá
Nunca te dei porra nenhuma
Você fuma o que vem
Entope o nariz
Bebe tudo o que vê
Faça o diabo feliz
Você vai terminar tipo o outro mano lá
Que era um preto tipo a
Ninguém entrava numa
Mó estilo
De calça Calvin Klein
E tênis Puma
Um jeito humilde de ser
No trampo e no rolê
Curtia um funk
Jogava uma bola
Buscava a preta dele no portão da escola
Exemplo pra nós, mó moral, mó ibope
Mas começou colar com os branquinhos do shopping
"Aí já era"
Ih mano outra vida, outro pique
Só mina de elite
Balada, vários drink
Puta de butique
Toda aquela porra
Sexo sem limite
Sodoma e Gomorra
Faz uns nove anos
Tem uns quinze dias atrás eu vi o mano
Cê tem que vê
Pedindo cigarro pros tiozinho no ponto
Dente tudo zoado
Bolso sem nenhum conto
O cara cheira mal
As tia sente medo
Muito louco de sei lá o quê logo cedo
Agora não oferece mais perigo
Viciado
Doente
Fudido
Inofensivo
Um dia um PM negro veio embaçar
E disse pra eu me pôr no meu lugar
Eu vejo um mano nessas condições: não dá
Será assim que eu deveria estar?
Irmão, o demônio fode tudo ao seu redor
Pelo rádio, jornal, revista e outdoor
Te oferece dinheiro, conversa com calma
Contamina seu caráter, rouba sua alma
Depois te joga na merda sozinho
Transforma um preto tipo A num neguinho
Minha palavra alivia sua dor
Ilumina minha alma
Louvado seja o meu senhor
Que não deixa o mano aqui desandar ah
E nem sentar o dedo em nenhum pilantra
Mas que nenhum filha da puta ignore a minha lei
Racionais capítulo 4 versículo 3
Aleluia, aleluia, racionais no ar filha da puta, pá, pá, pá
Quatro minutos se passaram e ninguém viu
O monstro que nasceu em algum lugar do Brasil
Talvez o mano que trampa de baixo do carro sujo de óleo
Que enquadra o carro forte na febre com sangue nos olhos
O mano que entrega envelope o dia inteiro no sol
Ou o que vende chocolate de farol em farol
Talvez o cara que defende o pobre no tribunal
Ou que procura vida nova na condicional
Alguém num quarto de madeira lendo à luz de vela
Ouvindo um rádio velho no fundo de uma cela
Ou da família real de negro como eu sou
Um príncipe guerreiro que defende o gol
E eu não mudo mas eu não me iludo
Os mano cu de burro têm, eu sei de tudo
Em troca de dinheiro e um cargo bom
Tem mano que rebola e usa até batom
Vários patrícios falam merda pra todo mundo rir
Ah ah, pra ver branquinho aplaudir
É, na sua área tem fulano até pior
Cada um, cada um: você se sente só
Tem mano que te aponta uma pistola e fala sério
Explode sua cara por um toca fita velho
Click pláu pláu pláu e acabou
Sem dó e sem dor
Foda-se sua cor
Limpa o sangue com a camisa e manda se foder
Você sabe por quê? pra onde vai? pra quê?
Vai de bar em bar
Esquina em esquina
Pegar 50 conto
Trocar por cocaína
Enfim, o filme acabou pra você
A bala não é de festim
Aqui não tem dublê
Para os manos da Baixada Fluminense à Ceilândia
Eu sei, as ruas não são como a Disneylandia
De Guaianazes ao extremo sul de santo amaro
Ser um preto tipo A custa caro
É foda, foda é assistir a propaganda e ver
Não dá pra ter aquilo pra você
Playboy forgado de brinco: cu, trouxa
Roubado dentro do carro na avenida Rebouças
Correntinha das moça
As madame de bolsa
Dinheiro: não tive pai não sou herdeiro
Se eu fosse aquele cara que se humilha no sinal
Por menos de um real
Minha chance era pouca
Mas se eu fosse aquele moleque de touca
Que engatilha e enfia o cano dentro da sua boca
De quebrada sem roupa, você e sua mina
Um, dois
Nem me viu: já sumi na neblina
Mas não, permaneço vivo
Não sigo a mística
Vinte e sete anos contrariando a estatística
Seu comercial de TV não me engana
Eu não preciso de status nem fama
Seu carro e sua grana já não me seduz
E nem a sua puta de olhos azuis
Eu sou apenas um rapaz latino-americano
Apoiado por mais de 50 mil manos
Efeito colateral que o seu sistema fez
Racionais capítulo 4 versículo 3
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