Meu bordado
Sofia freire
Quando eu era criança
Minha prima mais velha
Quase uma mulher
Ela dizia
Bordava a sola dos próprios pés
Com uma linha crua
Fazendo geometrias
Escrevendo palavras
Desenhando ponto por ponto
Um relevo que no entanto
Não sangrava
É o trabalho da mulher
Ela dizia
Como se contasse um segredo
Como se transmitisse uma ideia
Ou uma doença
E às vezes ficava dias
Com a palavra paz pressionada
Contra o chão
A linha escurecendo de sujeira
Mesmo que ela se banhasse
Aquela palavra paz
Encardida em sua pele
Como o arremedo
De uma beleza distante
Minha prima mais velha
Quase uma mulher
Ela dizia
Bordava a sola dos próprios pés
Com uma linha crua
Fazendo geometrias
Escrevendo palavras
Desenhando ponto por ponto
Um relevo que no entanto
Não sangrava
É o trabalho da mulher
Ela dizia
Como se contasse um segredo
Como se transmitisse uma ideia
Ou uma doença
E às vezes ficava dias
Com a palavra paz pressionada
Contra o chão
A linha escurecendo de sujeira
Mesmo que ela se banhasse
Aquela palavra paz
Encardida em sua pele
Como o arremedo
De uma beleza distante
Hoje
Que estou crescida
E que sou eu mesma uma mulher
Com toda a certeza
Confesso que não sei bordar
Em outro tecido
Que não seja a minha pele
Mas diferente
Da minha prima mais velha
Que agora mora sob uma lápide
No cemiteriozinho do monte
Eu sangro
Eu sangro muito
Especialmente quando bordo
As palavras paz
Liberdade
Ou o meu próprio nome
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