Sonhos de cadáver
Acceptus noctiferMaxilas cor d'âmbar, frias como o gelo,
Faces descarnadas, crânios sem cabelo,
Formas onde a carne se desfez em pus
Despiu-nos a terra o tórax e os diversos membros.
Das bocas sem lábios sai-nos uma trova,
Que é como um punhal esfarrapando a pele.
A desoras, quando treme o arvoredo,
E o silêncio esmaga as fortes ventanias,
No baile macabro damos as mãos frias
E vamos dançar cancãs que metem medo.
E quem sabe lá, profunda noite escura,
As voltas que demos quando ainda não
Tínhamos descido à negra vala impura.
Ai quem sabe lá! Que a vida é enigma
Aonde entramos rindo sem pensar na seca vida...
Vale mais morrer, que a morte é a saída...
Dessa pena injusta, desse infame estigma.
Desse imundo charco...
A dor e a angústia, o desengano e a febre,
O ouro de um palácio e a fome de um casebre...
Que para ver males é que nós nascemos
Pelas podridões das bacanais devassas,
Onde o vício bebe por lascivas taças,
O veneno um que nos estraga o sangue.