A queda do ladrão
Bê oMeu marido, ferido, na porta do bar
Foi no peito, não teve jeito, eu custo acreditar
Conceito escorrendo sem cuspadi se importar
Desço o morro angustiada com a apreensão da molecada
Na televisão a morte é friamente comentada
Sujam nossa quebrada, omitem a verdade
A audiência deles vale nossa dignidade
Agora de que vale tanta vaidade?
Misturada com uma grande dose de necessidade
Réu porta uma hk, vítima porta um fuzil
Mais uma cena rotineira nas quebradas do brasil
Você suando frio e teu sangue ainda quente
Pintando na avenida o nosso fim deprimente
Olho pra você estirado no chão
Com o asfalto quente beijando teu coração
A vizinhança povoando a nossa volta
Assistindo o meu choro de tristeza e revolta
Mas que derrota eu já previa o fim
Agora eu sei o que no culto Deus falou pra mim
Que o fim do sofrimento seria muito breve
Pra eu esperar no senhor e ter fé nessas preces
Mas parece que o inimigo ri da nossa ilusão
E a multidão assiste a queda do ladrão
Que humilhação todo mundo me olhando
Nas filas da visita eu não sofria tanto
De canto nosso pequeno me abraça, tanta lágrima cai
Ai meu Deus como é triste crescer sem pai
Tanto faz quem tá certo, quem tá errado
A guerra foi perdida, desde o primeiro assalto
Pra essa novela não tem outro final
É sempre igual grade ou funeral
Cuidado pra não se enforcar
O crime é um caminho sem volta
Domingo, 25, o céu parece chorar
O outono vai se despedir pro inverno chegar
Só queria avisar as minas, os manos
Que o crime é cruel, a gente mesmo se enforcando
Meu corpo me representa nesta sociedade
Estou fora do padrão, estou fora da classe
Mas pela informação não me rendo ao sistema
Sei da história do meu povo, sei da nossa resistência
Mas me sinto impune, me sinto sozinha
Vendo o sangue escorrer do teu corpo sem vida
Tive garra, tive fé, não pude te socorrer
Tudo tem sua raiz, tudo tem seu proceder
Algo que te fez estar ali, algo que te deu coragem
De botar a cara na rua, sair da invisibilidade
Cada personagem exerce o teu papel
Matar ou morrer, ter ouro no inferno ou passagem pro céu
A vida tem seus caminhos, suas propostas
Tem suas passagens, cada um escolhe sua porta
Quem tem culpa de verdade, não vai pro julgamento
Ele nunca respirou o ar de onde nós vivemos
Mas planejou todo o nosso sofrimento
Assinando uns papeis, violando uns direitos
Senhor tem piedade eles não sabem o que fazem
Leva essa dor, faça com que eles parem
De que vale? Já estamos no fim da linha
O foda é que essa guerra não terminou ainda
Mulheres como eu segurando um retrato
De um retrato falado, nesse fim inesperado
Você tinha me falado que seria diferente
Mas o que passou, passou. E o tempo é indiferente
Sem bala no pente, com a coca do patrão
É ladrão, nada se leva desse mundo cão