Parafuso silvestre

Terno com ninguém dentro

Parafuso silvestre
Eu queria ser ator
Mas o ato se atrasou
E agora levo uma vida de farsante
Farto de infartar
O relógio me domou
E está sempre a me roubar o instante

Eu sou um impostor
Num mundo de isopor
O que se há de supor
Eu sou um impostor

Nesse imenso labirinto de escritórios
Em algum lugar eu sei
Que há uma gaveta
Perdida e esquecida
Dentro da qual existe

Um emaranhado de objetos
Velhos, belos, sujos e obsoletos
Que juntos contém mais vida
Do que tudo mais que os rodeia
Inclusive eu e você
Sr. Terno com
Ninguém dentro

Tentei fugir
Tentei sumir
Tentei escapar pela válvula de escape
Eu tentei fugir pelo cano de escapamento
Tudo que encontrei
Foi um bode expiatório

A pior dor é a que se sofre pra dentro

Eu fui trabalhar um dia
Não via que estava morto
Vendendo meus sonhos
Pra comprar conforto

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