Princípio (part. adriano gomes)
Ita cunhaSobre o céu do continente
Se ouviu a água corrente
Cortar a pampa charrua
Nascia a raça mais crua
Que o espinho da japecanga
Pra olhar a boca da sanga
Comungar hóstias de luas
Voaram então duas pedras
Sobre as cabeças, rodando
E viu-se um potro bolcando
Levando o primeiro tombo
Pra depois, manso de lombo
Carregar um índio campeiro
E se ouvir no pago inteiro
Patas baterem qual bombo
Rasgou no céu a faísca
De um raio em noite de guerra
Que enraizou-se na terra
Bem vinda, fértil e mansa
E o fio da adaga e da lança
Com o mesmo aço que veio
Moldou-se à boca, nos freios
Dos cavalos de confiança
Morreu a rês pela faca
E principiou-se a sangria
Demarcando a geografia
Em rastros e morredouros
Quando o avesso dos couros
Que toldaram os benditos
Trançaram relhos e ritos
Em mil peleias de touros
Se vieram os dias, as noites
Romanças e ventanias
As vacas chamando a cria
Em rodeios e entreveiros
Barbarescos aguaceiros
Molhando a alma da gente
Que fecundou a semente
Na gênesis dos campeiros
No princípio foi assim
Se fez o céu e a terra
E as águas primordiais
E os gaúchos tão iguais
À sua própria imagem
Fez-se a luz, a paisagem
Os bichos e o firmamento
Depois, a chuva e o vento
E nem precisava mais!